sábado, 8 de março de 2008

Treme Treme II

Explicando agora, depois de um promessa anteriormente feita, a imagem do primeiro post. Atão, é assim, não é preciso saber decore a história dos Dead Kennedys para compreender o que vou escrever. Tal como os Sex Pistols vão ficar internamente associados ao movimento punk e a estúpida ideia que eram um criação do seu agente, que é um piada por muitos incompreendida transmitida no filme The Great Rock 'n' Roll Swindle, de 1980, o Kennedys vão estar ligados a vários actos que desafiaram as autoridades e a perseguição e tentativa de destruição da memoria colectiva destes (não é teoria da conspiração, é verídico).

Um dos exemplos de um das primeiras brincadeiras da banda foi a sua actuação nos Bay Area Music Awards. Pois, estavam lá todos os grandes da indústria musical do estado da Califórnia e eles eram suposto tocar o California Über Alles, representando esta cerimónia a abertura da indústria a vertentes musicais mais undeground das quais os Kennedys eram representantes. Então esta banda, que tem já um nome desafiante e ficou celebrizada por atacar políticos e suas políticas, os abusos de poder e comportamentos sociais estereotipados, decide fazer um ataque à comercialidade musical onde todas as palavras estão a marinar numa margarina jocosa. Poucos segundos após começarem a tocar o tema California, Biafra interrompe e diz "Hold it! We've gotta prove that we're adults now. We're not a punk rock band, we're a new wave band". E a partir dai é o descalabro, canta-se Pull My Strings (apenas interpretado uma vez na carreira da banda) e nunca mais os Kennedys foram convidados para algo parecido, o que não espanta pelo acto e pelas características deste projecto musical, que para quem não muito sobre eles nunca teve intenções de atingir patamares comerciais elevados (MTV Get Off The Air é o nome de uma das mais conhecidas canções), mantendo sempre credibilidade entre as ideias e as acções.

Mais histórias e uma pequena biografia dos Dead Kennedys e de Jello Biafra serão “postadas” em conjunto com as criticas a Frankechrist (Dead Kennedys 1985), Never Breathe What You Can't See e Sieg Howdy! (ambos de Jello Biafra com os Melvins, 2004 e 2005 respectivamente). Agora deixo-vos com a letra de Pull, que optei por não explicar porque mais claro do que é dito é quase impossível

"Pull My Strings"

I'm tired of self respect
I can't afford a car
I wanna be a prefab superstar

I wanna be a tool
Don't need no soul
Wanna make big money
Playing rock and roll

I'll make my music boring
I'll play my music slow
I ain't no artist, I'm a business man
No ideas of my own

I won't offend
Or rock the boat
Just sex and drugs
And rock and roll

Drool, drool, drool, drool, drool, drool
My Payola!
Drool, drool, drool, drool, drool, drool
My Payola!

You'll pay ten bucks to see me
On a fifteen foot high stage
Fatass bouncers kick the shit
Out of kids who try to dance

If my friends say
I've lost my guts
I'll laugh and say
That's rock and roll

But there's just one problem

[Chorus]
Is my cock big enough
Is my brain small enough
For you to make me a star
Give me a toot, I'll sell you my soul
Pull my strings and I'll go far

And when I'm rich
And meet Bob Hope
We'll shoot some golf
And shoot some dope

Is my cock big enough?
Is my brain small enough?
[Repeat chorus, etc. etc.]

Pink Went Nuts?



Afinal daqui não sai ainda uma “crítica” ao Ummagumma, quarto LP dos Pink Floyd, editado em 1969, que eu inicialmente tinha prometido pois achava que era bom falar de uma das minhas bandas favoritas (as outras são os Nirvana e os Police…Sim, sou um tipo esquisito que é capaz de não ouvir nenhum tema deste projectos musicais durante seis meses e ouvir tudo desde Paul Anka, passando por Shiina Ringo, até Cannibal Corpse!) e de um álbum que é na maioria dos casos mal compreendido e mal tratado, sendo até designado por Robert Christgau como “an admirable record to fall asleep to”. De qualquer modo, aqui vai-se falar do The Wall. Obra que regra geral as pessoas relacionam como aquela tema do “teacher leave the kids alone” e com os martelos do teledisco deste tema. O.K. pronto, estou a ser injusto, também muitos se lembra do Comfortably Numb, e alguns, pouquitos, com mais de quarenta, lembram-se do filme do Alan Parker feito em 1982 (salvo erro). Este LP, de dois vinis ou dois cds, conta a história de um músico, Pink, que vive uma típica vida trágica rockeira, com uma mistura perigosa de drogas, isolamento social, traumas que vão, a certa altura, borbulhar à superfície, desespero e um pouco, só uma “pitada”, de auto-destruição.

É para muitos um dos melhores álbuns Opera Rock de sempre (para além do Tommy do The Who), eu por mim prefiro designá-lo por um álbum conceptual, com um grande cunho reflexivo. E isto porquê? Olha, o álbum foi feito num período atribulado da vida da banda (um pior momento se seguiria), em que Roger Waters tinha começado a fazer uma limpeza ao seu sótão de ideias depois de ter cuspido na cara de um fã na tour In The Flesh (que promovia o álbum anterior, Animals). Então engendrou uma história, que para mim tem traços de auto-biografia, mais evidentes do que a mera coincidência de Waters com Pink terem perdido os seus pais na Segunda Guerra Mundial, no ano de 1944, em Anzio (Itália). De qualquer modo, se me dedicasse só a explicar porque é que Pink é Waters mais valia escrever um livro com os pros and cons (piada foleira para fans da música deste compositor).

INICIO DE SPOILERS

Avançando, a história fala de um sujeito traumatizado pela morte do pai, pela sua excessivamente protectora mãe, pelos professores frustrados que maltratavam psicologicamente os seus alunos, tentando transformá-los em ovelhinhas (se é menina é Martha Stewart, pré-cadeia, se é menino é…sei lá, Michal Jackson ainda negro?). Para isto ele constrói à sua volta um muro metafórico, e como todos os sujeitos, ou quase todos, com problemas vão para a música/ drogas ele torna-se um músico famoso e pára a construção do “muro” (refugia-se nesta nova vida), casando. Mas nem tudo corre bem, a mulher traiu (e é fria como o camádio!) e ele acaba por fechar a sua volta este artifício mental que o protege de todas as agressões externas. Após isto, temos a sua busca pessoal de contacto humano que sai infrutífera, descambando numa fantasia que permite a sobrevivência de si neste clima pesado que trespassa a história. A ilusão, de um líder que cariz neo nazi (não há suástica mas há martelos cruzados) a falar para uma multidão que o segue obcecadamente (parece num comício à lá Nurembega) e sobre a qual afirma as suas medidas de violência. Até que tudo PARA e o seu cérebro, meio confuso faz face a ilusão, pondo Pink num tribunal, e destrói o muro enfrentando a messy reality. Já agora, o álbum fecha com um frase que se conclui no início do mesmo (carácter cíclico da história, Giro!!!).

FIM DE SPOILERS

E pronto cá vai uma coisa mais específica, o alinhamento, os altos e baixos, que para uns é corrido de um tsunami de qualidade inegável e que um dia vai ser aceite como dogma por uma qualquer Igreja Universal da Santa Amolgadela (direitos reservados na SPA para mim) e que para outros “é prontos e coiso e tal” (elucidados? Não, olhem é algo que corresponde em lisboeta a “pois!”, a.k.a total indiferência).

O álbum inicia-se bem com In The Flesh?, com pujança começa o próprio Pink a anunciar que vai narrar a sua história. Depois segue-se momentos marcantes do álbum, como The Happiest Days of Our Lifes que introduz o carismático Another Brick in The Wall Part 2. O primeiro tem uma tirada linda “When they got home at night,Their fat and psychopathic wives would thrash them,Within inches of their lives.”, e refere-se aos, já mencionados, abusos dos professores, tal como o Another Brick 2 que é mais conhecido pela sua letra provocatória, que numa escola pós-vinte cinco de Abril foi usada como hino para uma greve liderada pelo meu padrinho, (“We don´t need no education, We don´t need no thought control, No dark sarcasm in the classroom, Teacher, leave those kids alone, Hey, teacher, leave those kids alone!”)]; o solo de guitarra de Gilmour; o coro das criancinhas e um bom teledisco. Ainda no primeiro cd (não tou para ir ver a correspondência no vinil), temos Young Lust, que precede a parte mais calma do álbum, que não o mesmo que dizer mais trágica, que nos fala de comportamentos luxuriantes de bacanos de rock (Kid Rock e o palhaço moor dos Creed com Groupies!) com uma malha sonora a condizer à história, uma rockalhada pesada para os Pink Floyd.

No segundo cd temos a maioria dos doces, Hey You, Is There Anybody Out There?, Comfortably Numb, In the Flesh, Run Like Hell.

“Together we stand, divided we fall” são com estas palavras que acaba a primeira faixa que referi, e mais não digo.

Is There Anybody Out There?, pois bem, no início dos anos noventa uma organização de luta contra a Sida usou este tema num anúncio televisivo que me assustou bastante (um indivíduo percorria um corredor do qual, das paredes de borracha ou algo desse tipo, se vislumbravam faces e mãos que tentavam alcançar o sujeito). Esta memória fermentou durante anos até que, fascinado pelo meu desconhecimento sobre autoria do tema que eu associava a um sentimento perturbador de isolamento (Hedgehog's dilemma), descobri os Floyd (história pessoal verídica e sem pessoal à chapada, como no Jerry Springer). Giro é que as emoções na percepção visual do anúncio e dadas pela música são as mesmas que o tema tinha como objectivo transmitir.

Musicalmente o tema mistura, tais como outros temas, samples de séries televisivas ou filmes com voz, mellotron, voz e guitarra clássica criando um ambiente desesperante, soturno e melancólico.

Comfortably Numb escrito inicialmente por Gilmour, acerca de Barrett, foi ajustado por Waters à história. Grande solo, letras que se repartem pelas memórias de Pink e pela acção de um médico de rockeiro pouco escrupuloso….simplesmente um clássico da terceira fase dos Pink Floyd (já explico, num artigo posterior, a carreira dos Floyd), um crowd pleaser (desculpem os constantes anglicismos mas estou a escrever isto à pressa e não tenho paciência para procurar os melhores equivalentes).

In the Flesh, sim, é mais um, este tem uma letra diferente com um discurso líder que tem resultados violentos, baseados na discriminação racial, religiosa, sexual (queers, jews, coons são referidos), no mundo de Pink. A postura de Bob Geldof (sim, o mesmo “ mister Junkie quero salvar África e todos no mundo do descontrolo da globalização”), que interpreta Pink no filme, demonstra bem o efeito hipnotizador que a personagem tem sobre o público. Filme, que já agora, depois de bem ouvido o álbum, merece ser visto….imprescindível para qualquer fã dos Pink Floyd

Run Like Hell é, como diria um amigo meu, malha da grossa. Baixo e guitarra dominam na composição acompanhando a descrição dos pavorosos actos de uma multidão desvairada, incitada por Pink. Lindo, nomeadamente a referência a porrada que se daria ao namorado que quer fazer qualquer coisa com a miúda no banco de trás do carro. DON´T BE NAUGHTY or they are gonna Kill YOU.

Mais info. – o álbum tem a duração de 81:27. Todos os temas são da autoria de Roger Waters, baixista e na altura ditador não eleito dos destinos da banda, excepto Young Lust, Comfortably Numb e Run Like Hell com co-autoria de David Guilmor, guitarrista, e The Trial, com co-autoria de Bob Erzin. Além deste dois membros da banda mencionados, o álbum foi também gravado pelos outros membros oficias da banda, Richard Wright, teclista, e Nick Manson, baterista, para além de outros talentosos músicos de estúdio, que não vale a pena aqui mencionar.

O sucesso do álbum, que conseguiu dar o primeiro número na tabela dos singles em Grã-Bertanha e E.U.A, foi tal que dele foi feito um filme, no qual o fio condutor da acção é contado pela banda sonora, que pouco ou nada difere do LP. Mas pêra ai, há diferenças! When the Tigers Broke Free e What Shall We Do Now? estão ausentes do disco mas não do filme. O primeiro é apenas editado em cd num reedição do The Final Cut de 2004 e o segundo foi riscado dos planos de edição do álbum por torná-lo demasiado longo para o vinil (lembrem-se que só dava para vinte e poucos minutos para cada lado), sendo apenas editado, legalmente, na versão ao vivo gravada durante a tour promocional. O que falta no filme é, quase inexplicavelmente, o Hey You, ainda não sei bem porquê!

Mais…sei lá! O Is There Anybody Out There – The Wall Live 1980-1981, o dito álbum ao vivo, tem todos os temas do The Wall mais o Shall We e um instrumental intitulado The Last Few Bricks, que foi introduzida para permitir que o muro pudesse ser construído todo, separando o público da banda, até o fim da primeira parte do espectáculo (pois é, o espectáculo “teatral”, à falta de melhor termo, que acompanha o concerto é genial, dos melhores de sempre, mas isso é outro artigo).

Prontos, mai nada!!! Na minha opinião a coordenação na transformação das ideias que Waters apresentou à banda (ideias essas que serão a base do The Wall e do The Final Cut, ou seja, dava para fazer dois duplos cds), por parte de Bob Erzin e James Guthrie, foi mais que boa, mas fora do enredo da história muitos dos temas apresentam-se desnudados, sem “gás”/pica, por muitos deles não serem singles nem temas amigáveis para a divulgação radiofónica, o que não quer dizer nada quanto à qualidade da obra.

É calão, não quer ler, então comece por aqui a leitura

Em suma, álbum vale como um todo, como todo o álbum sinfónico, como, para mim, todos deviam valer. Tem um enredo cada vez mais interessante para o mundo em que vivemos (fuga aos problemas, a minha teoria da avestruz egoísta, isolamento social), é coerente (tempo de duração, estilo musical), sobrevive ao teste do tempo (vai fazer trinta anos em 2009 e mesmo assim continua a vender, a passar na rádio e a cativar novas audiências).

Sai da cabeça do BEAN com um consistente 4/5.


Té lá VIVA AO BACALHAU

P.S. É um dos LPs que Domingos António (pianista português que é, no mínimo, talentoso) mais gosta. Para mim, é um dos meus favoritos, número três no top dos Floyd, os outros terão de esperar para saber.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Deus de Chocolate

Ainda estão por perceber os motivos pelos quais me foi endereçado um convite para "mandar uns bitaques" num blog de música... e se duvidam não o farão depois da leitura em questão.

Ora, de todas as pessoas que conheço, eu serei certamente a menos habilitada para tal, até porque a minha visão da música prende-se com uma razão puramente hedonista, nua de preconceitos que a vestem e despem ao sabor de modas e tendências. Não a sei catalogar, não a sei analisar, não a sei departamentalizar (mal distingo elementos de cordas de percussão), e muito menos a sei comentar com o rigor e objectividade de alguns pseudo-entendidos na matéria; o pouco que sei é ouvi-la, e o melhor que sei é vivê-la... e isso meus amigos, é meu, é pessoal, é intransmissível, não cabendo em chavões exuberantes, e extrapolando quaisquer lugares-comuns redutores de uma realidade intangível. Direi mesmo sobrenatural!

Recuso-me desta feita a racionalizar uma dimensão tão ambígua e intocável para o mais comum dos mortais, pois a música meus caros, é algo de divino, estando na sua origem certamente um qualquer Dionísio, que entregue aos valores mais sublimes da vida percebeu que antes de um bom charro ou um raro chardonnay existia um qualquer elixir alquímico que com uns simples passos mágicos (notas musicais) nos transportava para um outro universo, onde o prazer é infinito, o sonho é ilimitado (“Innocent when you dream”*) e a nossa alma se imortaliza…

Come with me to the “Sea of Love”*, escuto, e vou ao encontro desse murmuro melodicamente alienígena, que me encaminha para uma estrada sem ponto de partida, enquanto a percorro, tão expectante quanto o dia em que recebi o meu primeiro playmobil, vou trauteando “Waltzing Matilda”*, a única e fiel companheira de viagem. Durante os escassos minutos em que me encontro a flutuar sobre um intenso mar azul, nessa réplica felizmente malfeita deste Planeta caótico, na pequena Terra do Nunca, os meus collants verde maçã deixam de repente de obedecer a um qualquer ideal andrógeno simbolizando antes a minha eterna luta contra os “ganchos” do mundo, encarnando o lado do imaginário pueril da saudosa e distante infância numa batalha “não tão perdida” como estou habituado contra os vícios e ganância dos desprezíveis adultos… Lá encontro o Deus dos Deuses, “Este” é feito de chocolate (“Chocolate Jesus”*), questionando-me, assim, como é possível caminharmos para um mundo melhor enquanto todos os seus homónimos da Humanidade continuarem a simbolizar sofrimento, pecado e abnegação da Essência do Homem – Ser Feliz! - Não, grito! O meu Deus é de chocolate, a única coisa em que posso crer é num Deus feito de Chocolate, e se formos bem a ver as coisas perguntem a uma qualquer criança, aqueles loucos seres com uma ainda réstia de autenticidade provocada por uma limitação espaço-temporal na sua formatação, com que divindade eles sonham, se a de ouro se a de chocolate, eu não tenho dúvidas… o meu hino, assim como o de outros pequenos e valentes escudeiros que me acompanham, ressoa das nossas gargantas e ecoa pelos vales e montanhas daquele paraíso forjado de inocência, tal é a paixão com que o fazemos, que lá longe, num qualquer barco com uma caveira pintada, se ouve o pujante “I don’t want to grow up”*, efemerizando por escassos segundos as virais disputas entre a maior coxa de frango, ou a melhor cama, para não falar da guerra eterna do posto de sub-capitão e de quem tem o direito de jantar ao lado do déspota. Estes, gostam do que ouvem mas não gostam do que os faz sentir, daquilo que tiveram de abdicar para serem o que são hoje, e como odeiam a sua condição de mutantes… (mutantes, sim, porque ainda acredito que a matéria original seja esbatida de um substrato altruísta e que a maldade, a inveja e corrupção não passem de alterações cromossomáticas de um DNA colectivo cristalizado numa cultura predominante, mas passageira. Caprichos do tempo, penso!) mas tão rápido como o nó de gravata que faço e todos os dias me inquieta, depressa voltam à sua sanidade ou economia mental.

Depressa se faz tarde, peço então a Alice*, a pequena e sapiente fada que me acompanha nesta jornada epopeica, para me levar para casa -“Take me home”*, digo - esta, agarra-me na mão direita e sussurra-me aos ouvidos o que sabia que o meu coração angustiado pela partida ansiava ouvir - “Hold on”*, we can take the “Long way home”*- e eis que não quando ao mesmo tempo que oiço a sua mensagem apaziguadora vem contra mim um piano com características humanas, desvio-me do mesmo e penso “The piano has been drinking”*, dou uma enorme gargalhada, não me esqueço de Alice e replico sorrindo “You can never hold back spring”*!

Chego a casa, e o azul do meu quarto é a única ponte entre os dois mundos, e enquanto adormeço sou assaltado pelas palavras de um comparsa de quem gosto, “só acredito num Deus que saiba dançar”, diz… é justo Nietzsche, e se Esse souber cantar e tocar, contar histórias que me evadam e souber a chocolate, juntos podemos formar uma religião!

* Todas estas músicas são do génio Tom Waits, e esta é apenas uma pequena homenagem à sua grande obra que continua para durar, espero, muitos anos!

** Para o texto ter algum sentido, ou para o tornar ainda mais bizarro vai uma deixa, ouvir as referidas músicas à medida que o discorrem…


sábado, 2 de fevereiro de 2008

Um colosso genial



Começo ribombante, matraquear incessante: sem pausas, sem contemplações. É, por ventura, a característica que define Bedlam in Goliath: a ausência de um vazio sonoro, vulgo silêncio, preenchido este por múltiplas camadas de som que, meticulosamente intrincadas, se conjugam num todo simultaneamente complexo e "catchy".

De facto, os The Mars Volta são, sem qualquer dúvida, os Sonic Youth desta década. Falamos pois da experimentação sem limites - recorrendo inclusive a uma parefernália instrumental - materializada aquela em músicas capazes de oscilarem entre os dois e os dez minutos de duração, mantendo igualmente uma coesão e um sentido de unidade que saltam à vista. A acrescentar ainda essa salutar e verdadeira prova de grandiosidade musical que consiste na predisposição para a improvisação, honesta e imprevisível, capaz de prolongar um concerto de uma para três horas. Quantos artistas - não contando os de jazz e blues - o fazem hoje em dia ?

Bedlam in Goliath é, pois, todo um colosso, espécie de Adamastor com infinitas pernas e braços, que nos obriga a ouvi-lo atenciosa e repetidamente, pois só assim conseguiremos apercebermo-nos da sua real imponência. Em suma, é um album com A maiúsculo, daqueles que exigem esforço e dedicação por parte do ouvinte, algo cada vez mais raro nos dias que correm. Aliás, é por isso mesmo que muitos críticos acusam os Mars Volta de diletantismo musical, de falta de objectividade, habituados que estão à plastificação musical que por aí reina.

Voltando ao nosso objecto de análise, doze faixas irrepreensíveis, registando-se a homegeneidade fulgurante de um album que nunca perde em ousadia, engenhosidade e dinamismo, tudo moldado por uma louca e inteligente agressividade melódica, não de uma forma deprimente, mas antes como um animal selvagem incontrolável capaz de deslumbrar o comum dos mortais pela sua pureza e beleza. Resumindo, dos Mars Volta nunca sabemos o que nos espera, verdadeiro testemunho do virtuosismo de Omar Rodriguez-Lopez, Bixler-Zavala e seus comparsas, a que se junta agora um polvo da percussão chamado Thomas Pridgen (que óptima estreia!).

É realmente um album excitante, em que a melodia com que uma música se inicia não é necessariamente aquela com que ela acaba, sinónimo das impressionantes transfigurações que estes Mars Volta conseguem concretizar. Num exercício deveras ridículo - dada a qualidade de todo o album - comprovem-se estas minhas afirmações atentando por exemplo em exemplos de mestria musical tais como uma "Metraton" ou uma "Agadez". Desde a musicalidade concentrada de "Wax Simulacra", passando pela zeppeliniana "Goliath", até ao crescendo latino de "Ouroborous", destacando-se ainda a multifacetada "Askepios" e...
Porra, o album é óptimo. Ponto.

Convém ainda atentar nas vocalizações de Cedric Bixler-Zavala, num registo mais agudo do que o ouvido nos anteriores albuns dos Mars Volta e definitivamente distante do "in your face" dos At the Drive In, prova do amadurecimento - e pelos Deuses, que amadurecimento! - que estes músicos do mais alto quilate têm vindo a sofrer.

Concluíndo, este é, até agora, o melhor album saído este ano e certamente irá estar bem no topo da minha lista de 2008.

The Mars Volta

Bedlam in Goliath (2008)

Nota: 4.5/5






P.S. Exercício por ventura interessante será comparar este barroco musical com a despojada simplicidade de uns Vampire Weekend, logo - injustamente diga-se de passagem -comparados com uns Arcade Fire. Mesmo que não o sejam, intrínsecamente representam aquilo que estas massas sem qualquer sentido crítico querem ouvir: nihilismo sonoro, despreocupação e descomprometimento totais, música estandardizada. Ora, se de vez em quando, de modo a manter a sanidade mental tal é recomendado, o contrário já é sinal de que algo, definitivamente, vai mal.

Colocando estas chatas introspecções momentaneamente de lado, contém para o próximo "post" com uma crítica ao Pet Sounds dos maravilhosos The Beach Boys, o album que eu vou obrigar a minha próxima namorada a ouvir, verdadeiro monumento ao amor simples e adolescente. Hmm um bocado lamechas...
Abraço ! ;)

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Treme Treme e Crianças Esfomeadas (Jello Biafra)


Como a minha tendência é de consumir LPs já com uma certa idade (dez anos para cima), uns mais avinagrados, outros mais carregados de um doce aroma à Porto, fiquei a reflectir sobre o interesse em escrever para um blogue todo moderno como este (reparem que para o design, concepção e realização da ideia eu apenas contribui com um inaudível “Sim” acompanhado pelo seu primo afastado, e epiléptico, que desilude qualquer um com a sua incapacidade discursiva “pois...é uma boa ideia”), e depois cheguei lá na minha mente “Há cacas ai, algumas ai Jesus, outras maiores malhas que eu sei lá o quê (sempre importante salientar o sei lá o quê), que merecem ser relembradas ou abordadas de novo com outros ouvidos e olhos (pois meus amigos é que aqui o Bean já comprou Lps e cds só pela capa, quando se tem dinheiro funciona, caso contrário apanha-se cada desilusão às vezes…eu sei que é estúpido mas eu gosto de experimentar coisas às cegas). E, prontos, complemento o avant-garde do outro gaijo com o meu atraso temporal (veja-se que só este ano é que comprei o último álbum da Fiona Apple, I am a shameful naughty boy).

O.K., depois de uma intro, que cheira mal, vem o primeiro prato, o ano é 1980, a banda são os “fabulosos” Dead Kennedys, o álbum é o seu primeiro, Fresh Fruit for Rotting Vegetables. E a história começa assim, mal gravado, sem condições monetárias e materiais, gravado com poucos overdubs vocais, quase ao vivo, uma tanga de gravação para quem tá, como eu, mal habituado a ouvir rock-art, rock progressivo (ODEIO LABELS!!! Um dia vou explicar porque é que nunca houve algo chamado Grunge, mas deixo isso no ar por agora, sem receio de levar um bélinha de algum fã mais obcecado de Nirvana, Pearl Jam, Soundgarden, Melvins ou Dinossaur Jr.), algo com uma qualidade sonora e detalhe auditivo que não pode ser entregue ao consumir deste modo “afiambrado”. É esta barata esmagada mas que ainda corre que tem piada, a verdade é que o bicho abre as portas para uma atitude de critica política no punk dos EUA diferente, quase que nasce aqui o hardcore (entenda-se punk hardcore) americano (acho que a mãe deste “movimento” são os Reagen Youth). Já agora, vejam a linda capa foto tirada a carros da polícia a arder, resultado de um motim que não vale aqui a pena explicar. É forte a imagem, carregada de indignação que corrói toda a obra (e a contra capa não desdenha, seja a versão original da banda de lounge com olhar patético ou a foto das velhinhas). Pois, há indignação, mas com humor, não é só um sujeito que fala (sim Biafra não canta, fala alto) X verdades sobre o “sistema” (coisa maravilhosa que prejudicava o Sporting Clube Portugal a alguns anos atrás e que nenhuma aventesma televisiva ainda explicou), é mais do que isso, ele tem piada, põe o dedo na ferida e não a calca porque é fixe faze-lo, há quase que uma necessidade gritante de infligir dor aos que critica ou aos nossos ouvidos, ainda não sei bem!. A dor não acaba ai, ele não se limita a abordar um assunto de forma sintética, ele espeta lá o dedo e troce-o, além do mais a qualidade textual das letras varia entre o “mais conteúdo do que acho que teria quando primeiro ouvi” e “in-your-face”. Esta dualidade é prática, não aliana o ouvinte e não esgota os temas nas primeiras audições, mesmo as frase mais cortantes, acompanhadas com uns “catchy rifs” de East Bay Ray, e uma competente secção rítmica de Klaus Flouride e do pouco conhecido Ted (menos ainda será o 6025), ficam a trabalha no estômago não seguindo para o recto como a maioria de trampa musical servida às ovelhinhas todas que dão discos de ouro no mercado americano a Madonnas e afins pimba/ pop- rock (Ai, como odeio Labels, mas dá jeito!) que ela patrocina.

Passando agora ao coiso e tal que todos apreciam, os Highlights Musicais. Começamos pelo nome dos temas, temos o Kill The Poor, Let's Lynch the Landlord, I Kill Children, que não sei quanto a “vocesses”, mas a mim atrai-me títulos audazes, depois há o Chemical Warfare, California Über Alles e Holiday in Cambodia, que são também elucidativos do que falam (política americana interna e externa), e uma versão de fazer saltar o chapéu de qualquer milionário texano que passa demasiado tempo em Vegas e fica liso que nem um carapau, refiro-me ao belo Viva Las Vegas.

Então, notas giras, Kill the Poor, primeiro tema do álbum, foi interpretado, juntamente com o California, como um tema referência dos movimentos de extrema-direita californianos (pois, é que muita gente não compreende ironia e sarcasmo, e ambos os temas são perus recheados disso, criticando-se o abuso de poder e as politicas republicanas). Let's Lynch the Landlord e I Kill Children, são directos à questão, o primeiro fala de senhorios que exigem demasiado dinheiro para as condições que proporcionam ao inquilino e como tal mereciam levar um balázio no cu (é mais lincha-lo mas “nevermind”) e o segundo abre com uma linda frase “God Told Me to Skin You Alive”, sendo que é curiosamente considerado pelo seu autor, Jello Biafra, como o seu tema mais fraco, e conta da perspectiva de um assassino de crianças os seus actos (eu gosto é da primeira frase!). Deutschland Über Alles, é assim que começa o hino alemão, verso que aliás não é cantado, “jamais, ainda ficam a pensar que somos nazis com tendências expansionistas”. Com esta ideia Biafra pegou no verso pôs California e chamou a atenção para algumas práticas menos democráticas que a serem implementadas abririam, e abriram, portas para todo o tipo de abusos (“Quem é que falou do Socrátes!”). Holiday in Cambodia não vale a pena descrever, é muito bom, é mesmo para ouvir, só de referir que no refrão diz-se de forma enérgica POL POT.

É calão, não quer ler, então comece por aqui a leitura

Em termos gerais, e em jeito de final, o álbum é bom, consistente, enérgico, audaz para 1980 (talvez ainda hoje o será em alguns aspectos) não envelheceu mal (criticas politicas do inicio dos anos oitenta exigem ter alguns conhecimentos do local e do período), tem humor e talvez seja o melhor álbum dos Dead Kennedys, apesar das referidas falhas de produção do mesmo. Ou seja, sai da cabeça do BEAN com um 4/5.



Nos próximos episódios critica a Aerial de Kate Bush, Ummagumma dos Pink Floyd e uma pequena história sobre a imagem que acompanha este artigo.
Té lá VIVA AO BACALHAU

Ora viva, my fellow citizens !

Queria apenas deixar umas notas sobre o natureza do nosso/vosso blogue:

- quando analisamos albuns, as pontuações vão de 1 a 5, estando incluídos os naturais 1.5, 3.5, and so on...

- uma das nossas premissas consiste na LIBERDADE total de escrita, ou seja, vocês, nossos leitores, tanto podem encontrar artigos sobre uma música em particular, como sobre um album, ou então um mini-ensaio sobre uma dada banda ou até mesmo sobre a discografia da mesma.

Acima de tudo, aqui priveligiamos a honestidade e a emoção, artigos em que realmente se fale do album ou da banda em particular, sem maneirismos linguísticos imperceptíveis ou referências pseudo pós-modernistas muito estranhas, daquelas sem sentido nenhum. Se por vezes os nossos artigos parecerem estranhos, não se preocupem, nós somos uns idiots savants, c'est naturel portanto!

- E acho que estão os esclarecimentos feitos heheh. Contem dentro em breve com Dead Kennedys, Mars Volta, e, se se portarem bem - divulgando o blogue ;) - com Tom Waits.

Abraço!!!!!

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

kILL THat NoiSe


Directamente de uma costa leste situada na maior parafernália cultural existente neste universo - que mesmo assim consegue uma união político-cultural apta a desarmar a petulância de muitos europeus - chega-nos "a" banda que para mim definiu os anos 80.

Não, não foram os Joy Division, estou mesmo a referir-me aos Sonic Youth. Nenhuma outra banda conseguiu transmitir aquele sentimento de decadência urbana, de dúvida constante quanto às razões que nos fazem viver e manter a cabeça levantada todos os dias, de dúvida mesmo quanto ao devir, a todos os paradigmas que inconscientemente associamos como desejáveis para o nosso futuro e nos foram inculcados ao longo de anos em total subserviência intelectual. Dizia eu, nenhum outro grupo o fez e continua a fazer para gaúdio dos nossos pseudo-sapientes egos (que tudo julgam saber para se auto-destruírem a si próprios) como aquela orquestra de cinco seres humanos multiplicados por cinquenta, que de duas guitarras e um baixo extraem uma densidade sonora absoluta e distorcidamente vibrante, em simultâneo com uma presença rítmica constante, como aquelas coisas a que durante a nossa vida nós nunca ligamos, mas que no fundo – se escutarmos bem - estão sempre presentes.

Foram músicas como Brave Men Run (In My Family), Tom Violence, Shadow of a Doubt, Star Power, Teen Age Riot, The Sprawl, Hey Joni, Tunic (Song for Karen), e tantas, tantas mais ao longo de quinze LP’s e outros tantos EP’s, demos, bootlegs, and so on.

Tudo perfeitas simbioses de melopeias e pedaços de texto palavrosamente narrados/cantados para deleite dos nossos ouvidos e dos nossos preguiçosos corpos, cansados demais com toda a verborreia e nojeira musical que nos querem impingir diariamente, demasiadamente cansados com os nossos próprios insucessos diários e colectivos – apenas desejando esquecer e realizar os sonhos que ainda mantemos vivos num canto do nosso coração endurecido por tudo o que nos rodeia: rumo a um futuro melhor.

Jams you can run free now, the bad moon will not rise anymore.